Um dia a gente cansa

Hoje, conversando com uma amiga no Brasil, de repente me veio a vontade de correr à esse novo blog, palavra tão estranha que me deixa sempre na dúvida de como se escreve e escrever algo sobre um comentário pertinente que fiz à uma amiga cansada das noites, referindo-se ela às "baladas, pirulitos e música eletrônica". Um dia a gente cansa! falei à tal amiga.
Um dia a gente nasce, sem fazer a mínima idéia do que temos ao nosso redor, só faro de leite, porque se tivéssemos a tal consciência e o poder de decisão, nos cansaríamos rápido vendo pessoas estranhas com a cara plotada em nossa novíssima retina, dizendo: "que coisa mais linda" ou então num troca-troca de braços e votos de que seja saudável e feliz e coisa e tal. 
Cansamos de ficar deitados e então damos um jeito de levantar. Cansamos de somente levantar e vamos deixando coisas para trás, andando, caindo e aí, cansamos de cair sozinhos e passamos a cair ao lado da nossa primeira bicicleta. Cansamos dos nossos priminhos e partimos em busca de novos amigos. Estamos cansados de casa e eles então,  cansaram-se um pouco da gente, de uma maneira saudável, claro, como todos os outros corriqueiros cansaços. Logo nos arrumam uma matrícula numa escolinha do bairro, para aprendermos a nos sujar fora de casa, diminuindo assim, o trabalho da mamãe, que já está cheia de cansaço até mesmo  do papai, que por sua vez já se cansou dela há muito tempo. 
Cansamos de ser acompanhados até a escola e pedimos para ir sozinhos até que somos permitidos e aí, cansamos de pedir permissão. Precisamos sair de casa por que estamos nos sentindo cansados dela.
Queremos o primeiro beijo e nos cansamos dele antes que ele se canse da gente. Cansamos de ser adolescentes. Cansamos de viver aborrecidos e aborrecendo e queremos parar de ficar cansados, mas olha o que vem pela frente! trabalho, morar sozinho e passamos a nos cansar de verdade, fisicamente.
Cansamos de alguns amigos, mas estamos sempre no exercício de descobrir novos, pois precisamos repor aqueles aos quais nos levaram ao exercício da busca incessante. Buscamos...
Nos casamos e nos cansamos do casamento.
Continuamos nos casando e nos cansando dos próximos casamentos. Mas o mais curioso de tudo isso, é que quando nos damos conta do tal cansaço, achamos que isso é a coisa mais irritante que nos pode acontecer, aí sentimos fadiga, um desagradável mau humor e começamos a buscar algo que nos faça cansar no futuro.
Só não podemos nos cansar de viver, de buscar um novo cansaço, pois quando o corpo pede, logo seu pedido é realizado, quando o destino pede, percebemos somente depois que ele é atendido, e quando tudo pede, nada está perdido.